'Interessante isso, ainda mais naquele programa, ainda mais na tevê. O esforço, o silêncio. Principalmente o silêncio que a tevê tanto teme e ignora. Tudo o que é novo, moderno é automaticamente clássico, diria Odile na aula de inglês citando alguém que agora me foge.
A literatura.
A literatura.
[ silêncio ]'
'Eliot.'
'C'est la mer.
No.
L' éternité.'
Uma coleção ? Primeira/Verão ou Outuno/Inverno ? O tradicionalmente moderno clássico, tradicional iconoclasta dos filmes vestidos de nudez.
Nudez ?
Nudez não vende roupa.
Mas vende filmes.
Ah é...'
'As bombas explodindo, os tiros espetaculares, o sangue. E o cômodo parecia as vezes iluminado por um estrobo, piscando entre o diálogo que fazíamos. Branco, preto, cinza... branco, preto, verde petróleo, cinza, branco. Preto. Outra bomba na praia.'
'Pleno de técnicas. Mas eu penso que Hitchcock não sobreviveria ao vídeo, ao digital. Penso que era um cineasta que funcionava na película, sua desenvoltura de planos, movimentos dos personagens, a câmera, o clima que suspendia.'
'E há também casos do visível se tornar invisível como em Napoleão quando Abel Gance diz na Cahiers ter encontrado os negativos do filme e neles ter percebido até 16 imagens superpostas e que sabia que a partir da quinta imagem, já não se veria mais nada, mas o importante é que elas estavam lá, e assim, o potencial que elas traziam estava lá, como em uma música.'
'Lembro-me de Kafka em TRANSE. Com relação os filmes das Viagens, eu não julgaria apenas como referência porque a maioria deles pode escapar do objeto visível da obra, do espectro visível do filme. Nana de Renoir pode ser apreendido dependendo do apanhado cultural de cada um ou de Zola que as vezes pode ser até mais imeditado caso, por exemplo, o espectador seja um estudante de letras do que um cinéfilo. Jeanne de Dreyer também porque existe fisicamente no filme. Agora Preminger, Stroheim e Vampyr de Dreyer podem jamais serem decodificados porque estão numa outra faixa do espectro. É mais influência - seja ela qual for - do que uma referência. São como signos visíveis e invisíveis. Os visíveis podem ser, por exemplo, Jeanne d'Arc de Dreyer. Há os visíveis quase invisíveis como Allan Poe, caso o espectador desconheça O Retrato Oval ou mesmo jamais tenha conhecido Zola e seu romance. E há os invisíveis que são Carmen Jones, Vampyr. São camadas que podem ser sentidas e não necessariamente vistas.'
'L'Eclisse ? É impressão minha ou você está detido nele há um certo tempo, decupando meticulosamente, mas sem pressa, com certo cuidado. Você não acha Kazan meio enfadonho ? Eu as vezes acho. Não tem o vigor de Ray.'
'Godard está sempre criando categorias: daí o papel tão particular do discurso em muitos de seus filmes, nos quais, como notava Daney, um gênero de discurso sempre remete a um discurso de outro gênero. Godard vai dos problemas às categorias, com a possibilidade de as cateogiras criarem novos problemas. Por exemplo, veja-se a estrutura de Salve-se Quem Puder [a Vida]: as quatro grandes cateogiras: "o Imaginário", "o Medo", "o Comércio", "a Música", remetem a um novo problema, "o que é a paixão ?", "a paixão não é isso...", que será o objeto do seu próximo filme.'
'Sim. Não se lembra de Nana conversando com uma personagem feminina num bar sobre isso ? De que se levantamos o braço, pegamos um cigarro, sorrimos, andamos para lá ou para cá somos responsáveis, culpados por nossas atitudes. Não é exatamente estes exemplos, mas é isso que pauta este diálogo.'
''em JLG par JLG conversa com a montagem, tatilmente...sim, um personagem passa o dedo no celulóide na mesa de montagem e aí surge po áudio'
Isso me lembra diretamente uma cena de Um Homem com uma Câmera do Vertov. Mas com relação a imagens e não com o áudio, mas há esta questão táctil com a montagem, os planos, os planos fisicamente falando, sendo tocados, trocados e imediatamente através do toque 'algo' acontece ao espectador.'
Mas o apartamento não será abençoado. É refúgio, mas pode ir pelos ares. O que deve ser filmado é a fronteira. É uma idéia que tenho comigo e pretendo manter, dispersar. Filmar a fronteira com a condição de que seja ultrapassada tanto pelo cineasta num sentido quanto pela personagem real no outro. Pretendo fazer isso em todos os projetos. para isso é preciso tempo, um certo tempo. A fronteira só pode ser apreendida como fugidia, quando já não sabemos onde ela passa, entre o Branco e o Negro, mas também entre o filme e o não-filme. E é este o papel do apartamento. Não é uma aceitação e participação nessa recorrência dos curtas metragens metropolitanos, mas é a fuga, uma crítica que pode ou não ser entendida. Os filmes seriam silogismos, que a um só tempo integrariam os graus de verossimilhança e os paradoxos da lógica.'
'Não conhecemos mesmo a voz. O ato da fala já não remete à segunda função do olho, já não é lido, mas ouvido. Torna-se direto, e recupera os traços distintivos do 'discurso'. Paulistês. O telefone. Penso na cena de Filme de Amor onde uma personagem fala num celular antigo, os chamados 'tijolo' enquanto do outro lado do ambiente a outra personagem está com um telefone de fio de décadas passadas recentes. Ambas no mesmo ambiente. Uma falando para o nada, a outra olhando para o chão. E o assunto da conversa não cria uma relação direta de interlocutores, abre um terceiro canal que não faz parte da que fala, nem da que ouve e nem do terceiro personagem que nada tem. Uma mensagem que faz parte do fio na rua, no poste que aparece num plano anterior a este. É a voz que não se fala, apenas se vê. Vá várias vozes pelas ruas, mas não a ouvimos. Você não me ouve, você me vê, me lê. O ato da fala já não remete à segunda função do olho, já não é lido, mas ouvido. O cinema falado inventou o silêncio, já dizia Bresson.'
segunda-feira, 1 de outubro de 2007
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